No silêncio da noite
Ouvir rádio de madrugada costuma ser um ato solitário. Quem sintoniza seu aparelho a partir da meia-noite, se o faz, é porque, imagino, não tem muita coisa pra fazer além disso. Seja por insônia, por estar no trabalho, enfim. Pois certa vez, vi o Jayme Copstein, que comandou as madrugadas da Rádio Gaúcha por um longo período, dizendo que a audiência dessa faixa de horário é composta dos chamados 3 "V": velho, vigilante e vagabundo. Acho que tenho um pouco dos três, razão pela qual, principalmente nas férias, me dedico a passear entre as distintas opções que o dial oferece nas primeiras horas.
A Gaúcha, onde Jayme trabalhou antes de se aposentar e de, recentemente, retornar aos microfones pela Pampa, é a única emissora que possui programação local ao vivo, 24 horas por dia. Do início do dia até as quatro da manhã, o "Brasil na Madrugada" propõe atrações voltadas ao público que a rádio presume como cativo da madrugada - algo na linha dos 3 "V". É, por isso, um tanto quanto insuportável. Principalmente quando, para agradar o primeiro "V", os apresentadores Marcelo Matuasiak e Sara Bodowsky entrevistam médicos, que falam sobre pautas deveras agradáveis: reumatismo, perda de memória, disfunção erétil, varizes e por aí vai. Não é programa pra mim, mas os idosos adoram. E é imediata essa resposta do público, que participa pelo telefone com perguntas. Aliás, essa é outra característica da madrugada radiofônica: o ouvinte fala. O problema é que são sempre os mesmos que ligam. A dupla Sara e Marcelo vai até as 3h; das 3h às 4h, é Cláudio Monteiro o âncora, mantendo o mesmo esquema feito na primeira parte do programa.
As FM’s também abrem seus ouvidos pra quem está do outro lado. Numa delas, a Atlântida, um personagem clássico: Mr. Pi. Um mago. E digo isso porque ele consegue falar sobre o nada por 30, 40, 50 minutos. E bem. No Pijama Show, que começa às 22h e acaba às 2h, Everton Cunha atende ouvintes, roda música, recebe convidados e, claro, fala sobre o nada, tema que é simultaneamente abordado na Pop Rock, por Bívis e Oliver. Não com tanto talento, é bom que se diga, mas objetivando atingir o mesmo tipo de público, tal como no resto do dia. A começar pelo nome, "Pi, de Pipino", uma referência direta ao concorrente. O formato é semelhante ao da Atlântida, com a diferença de que se inicia um pouco mais tarde, pois até a uma da manhã temos Eron Dal Molin com o seu "Lei Seca", também voltado ao humor, mas com mais espaço para a música.
No 640 do AM, ouve-se o "Bandeirantes a Caminho do Sol". O nome, apesar de sensacional, acarreta um pequeno problema. O programa já existe há algum tempo, mas em São Paulo. A versão local surgiu no ano passado, só que, em vez de começar à meia-noite como o similar paulista, tem seu início às 23h. Embora coerente, soa estranho um programa caminhar para o Sol às onze da noite. Mas tudo bem. Ao menos, a intenção é boa, pois ele tenta apresentar um balanço dos fatos mais importantes do dia, num primeiro momento, e, na seqüência, fazer um debate, quase sempre sobre política. Pode ser meio desalentador ouvir deputado brigando madrugada adentro, ainda mais num momento em que se liga o rádio para, por exemplo, relaxar. Mas é válido, sempre tem quem goste.
A Guaíba, a exemplo do horário comercial, é morta na madrugada. Até a uma, tem um programa musical tão interessante quanto escutar um urologista falando de próstata ou um debate sobre reforma tributária. É o "Noturno Guaíba", com Fernando Veronezi. Só com os cantores que devem ter bombado na Rádio Nacional. Mais uma vez, imagino que haja aqueles que se interessem.
Já eu me interesso pelas características do rádio na madrugada. São programas peculiares feitos pra uma audiência peculiar. Além das que citei, o espectro eletromagnético também tem outras atrações no horário, mas a maioria tão legal quanto o "Noturno Guaíba". Quando, em altas horas, ainda estou com pique de ouvir notícia, ligo na Band, mas prefiro o FM. Em último caso, apelo para o CD ou, quando não estava estragado, o MP3. Esses aí são unanimidade pra qualquer ouvinte. Sendo boa a música, não tem quem não goste. Seja velho, vigilante ou vagabundo.
segunda-feira, 31 de março de 2008
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário